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quinta-feira, 6 de dezembro de 2018

Marxismo e cristianismo na América Latina por Michael Löwy


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Durante meio século, o marxismo foi - sob a forma caricatural do "comunismo ateu" - proscrito como o inimigo mais irredutível e diabólico da fé cristã. A excomunhão papal do pós-guerra foi apenas a sanção canônica deste combate implacável e obsessivo, que criou, na América Latina como no mundo inteiro, um muro de hostilidade entre os fiéis da Igreja e os movimentos políticos de inspiração marxista.

As brechas abertas neste muro graças ao surpreendente processo de convergência entre cristianismo e marxismo que se deu na América Latina no curso dos últimos 30 anos - em particular, mas não unicamente, através da teologia da libertação - tem sido um dos fatores de transformação social mais importantes na história moderna do continente. Alguns dos principais eventos sociais e políticos das décadas recentes -como a revolução nicaragüense, a insurgência popular em El Salvador e o novo movimento operário e popular no Brasil - são incompreensíveis e inexplicáveis se não se levar em consideração a profunda modificação da cultura católica latino-americana resultante da integração, por importantes setores da Igreja, de alguns temas essenciais do marxismo. Qualquer que seja o resultado da atual ofensiva autoritária de Roma - e não se pode excluir que tenha certo sucesso - estes eventos já são uma realidade histórica irreversível.

Esta evolução inquieta e preocupa não só os bispos e teólogos conservadores, os defensores da ortodoxia romana, os doutrinários da fé nas altas esferas do Vaticano e do CELAM, mas também os generais latino-americanos reunidos em Mar del Plata em 1987 e os conselheiros republicanos do presidente norte-americano (reunidos em Santa Fé em 1980 e em 1988).

Tratando de dar conta deste inesperado fenômeno, os conselheiros de Ronald Reagan recorriam, no documento de Santa Fé de maio de 1980, ao clássico paradigma explicativo policial - a "infiltração": "A política exterior dos Estados Unidos deve começar a afrontar (e não somente reagir a posteriori) a teologia da libertação... Na América Latina o papel da Igreja é vital para o conceito de liberdade política. Infelizmente, as forças marxistas-leninistas utilizaram a Igreja como arma política contra a propriedade privada e o sistema capitalista de produção, infiltrando a comunidade religiosa de idéias mais comunistas que cristãs". Inútil insistir sobre a grosseira inadequação deste tipo de "analise", perfeitamente incapaz de dar conta da dinânica interna destes setores da Igreja - que os levou freqüentemente a tomar posições contra o sistema capitalista de produção muito mais radicais que as "forças marxistas-leninistas" tradicionais (os partidos comunistas latino-americanos).

Mais recentemente, a mesma equipe de especialistas (desta vez a serviço do presidente Bush) publica um novo informe - conhecido como Santa Fé II - em que retoma, de maneira ligeiramente mais sofisticada, o mesmo esquema. Se trata agora da tática gramsciana dos marxistas, que descobriram que o método mais promissor para chegar ao poder é "dominando a cultura da nação, o que implica em um processo para lograr uma forte influência na religião, nas escolas, nos meios de comunicação e nas universidades. É neste contexto que se deve entender a teologia da libertação: como uma doutrina política disfarçada de crença religiosa com um significado anti-papal e anti-livre empresa, destinada a enfraquecer a independência da sociedade face ao controle estatista." A complexa e original relação entre o religioso e o político na teologia da libertação é assim reduzida a um vulgar "disfarce", fruto da maquiavélica estratégia dos marxistas...

No mesmo espírito se situa o documento sobre a teologia da libertação apresentado na Conferência Interamericana dos Exércitos, de dezembro de 1987. Embora muito mais detalhado e "competente" - provavelmente redigido por algum teólogo conservador, assessor das Forças Armadas - ele também interpreta o fenômeno no quadro geral da "estratégia do movimento comunista internacional na América Latina, através de distintos modos de ação".

Ora, um mínimo de bom senso seria mais do que suficiente para dar conta do fato de que a teologia da libertação -e a convergência, em setores da Igreja, de cristianismo e marxismo - não resultou de qualquer conspiração, estratégia, tática, infiltração ou manobra de comunistas, marxistas, gramscianos ou leninistas, mas essencialmente de uma evolução interna da própria Igreja, a partir de sua própria tradição e cultura. O que se trata de entender é porque, num momento histórico determinado - o começo dos anos 60 - e num espaço circunscrito - a América Latina - uma parte do clero e dos leigos cristãos (em particular católicos) vão sentir a necessidade de utilizar o método marxista de interpretação e transformação da realidade.

Deste ponto de vista, é muito mais interessante e perspicaz a análise do principal adversário romano da teologia da libertação, o Cardeal Ratzinger: segundo o eminente prefeito da Congregação pela Doutrina da Fé, durante os anos 60 "produziu-se no mundo ocidental um sensível vazio de significação"; nesta situação, "as diversas formas de neo-marxismo se transformaram em um élan moral, e ao mesmo tempo em uma promessa de significação, que pareciam quase irresistíveis à juventude universitária". Por outro lado, "o desafio moral constituído pela pobreza e a opressão não podiam ser ignorados no momento em que a Europa e a América do Norte haviam atingido um grau de opulência desconhecido até então. Este desafio exigia evidentemente novas respostas que não se podia encontrar na tradição existente até então. A situação teológica e filosófica mudada levava expressamente a procurar a resposta em um cristianismo que se deixasse guiar pelos modelos de esperança, fundados cientificamente, aparentemente, nas filosofias marxistas". O resultado foi a aparição dos teólogos da libertação "que fizeram sua a opção marxista fundamental". Se foi subestimada a gravidade do perigo que apresentava esta nova doutrina é "porque ela não entra em nenhum esquema de heresia que tivesse existido até então; seu ponto de partida se encontra fora do que pode ser enquadrado pelos esquemas tradicionais de discussão". Não se pode negar, reconhece o Cardeal, que esta teologia, combinando exegese bíblica e análise marxista, é "sedutora" e mesmo "de uma lógica quase sem falha". Ela parece responder "tanto às exigências da ciência como aos desafios morais de nosso tempo". Mas isto não a faz menos temível: "de fato, um erro é tanto mais perigoso quanto maior é a dimensão do núcleo de verdade que ele contém"1.
Resta a saber porque precisamente os "modelos de esperança" de inspiração marxista puderam seduzir tão significativos setores da Igreja Católica Apostólica Romana na América Latina. Mais precisamente: se partimos da evolução interna da Igreja, quais são os aspectos ou elementos de sua própria doutrina que puderam favorecer, facilitar, estimular a convergência com o marxismo? E, por outro lado, quais os aspectos ou elementos do marxismo selecionados neste processo de aproximação?

Um conceito que pode ser útil para este tipo de análise é aquele utilizado por Max Weber para estudar a relação recíproca entre uma forma religiosa (a ética protestante) e um ethos econômico (o espírito do capitalismo): afinidade eletiva (wahlverwandtschaft). A partir de certas analogias, de certas afinidades, de certas correspondências, duas figuras culturais podem - em determinadas circunstâncias históricas - entrar em uma relação de atração, de escolha, de seleção, de eleição mútua. Não se trata de um processo unilateral de influência, mas de um movimento dinâmico, ativo, de interação dialética, conduzindo, em alguns casos, à simbiose ou mesmo fusão das duas estruturas significativas. A título de hipótese, se poderia tentar circunscrever algumas destas áreas de afinidade ou correspondência entre cristianismo e socialismo:

- a libertação dos escravos e oprimidos como imperativo moral e como processo histórico. Trata-se de um tema de origem antigo-testamentário e não é um acaso se as comunidades de base e a teologia da libertação deram tanta importância ao livro bíblico do Êxodo.
- a valorização do pobre como vítima inocente da injustiça e como imune à corrupção imperante; o imperativo moral de agir para salvar o pobre. Obviamente, há urna distancia considerável entre o pobre da doutrina católica e o proletário da teoria marxista, mas não se pode negar um certo "parentesco" (Verwandtschaft) ético-social entre os dois.
-  universalismo, internacionalismo ("catolicismo" no sentido etimológico).Doutrina e instituições transnacionais, visando a humanidade como um todo. Humanismo, afirmação da unidade substancial do gênero humano, acima de raças, etnias, nações.
- crítica do individualismo. Como observa o sociólogo marxista Lucien Goldmann em seu livro sobre Pascal (O Deus Oculto), tanto o marxismo como o cristianismo rejeitam o individualismo puro (liberal/racionalista, hedonista ou empirista). Para ambos os valores supremos são trans-individuais: Deus para a religião, a comunidade humana para o socialismo.
-valorização da comunidade, da vida comunitária, da partilha comunitária dos bens. Crítica do anonimato, da impersonalidade, da alienação, da competição egoísta na vida "societária" moderna.
anticapitalismo. Max Weber apontava com razão para a existência de uma profunda oposição entre a racionalidade ética da Igreja católica e a racionalidade econômica do capitalismo. A Igreja rejeita um sistema econômico totalmente impessoal e reificado (Versachlicht), que escapa a seus imperativos morais e religiosos2. A crítica ao "capitalismo liberal" é um dos temas clássicos do magisterio da Igreja desde o século XIX até hoje.
- a esperança de um futuro reino de justiça e liberdade, de paz e fraternidade entre os seres humanos. Apontar para esta afinidade entre a utopia cristã e a utopia socialista não significa necessariamente aceitar a tese de Berdiaev, Karl Löwith e muitos outros, segundo a qual o marxismo não seria senão um avatar secularizado do messianismo judaico-cristão.

É evidente que o significado de cada um destes elementos é inteiramente diferente nos dois sistemas culturais e que estas analogias formais por si mesmas não constituem nenhuma razão de convergência. Por exemplo, nada mais oposto ao lugar do pobre na doutrina tradicional da Igreja - objeto de caridade e proteção paternal - do que o papel do proletário no pensamento marxista: sujeito da ação revolucionária. As correspondências que indicamos não impediram a Igreja de se reconciliar com a ordem capitalista e de considerar o socialismo, o comunismo e o marxismo como inimigos "intrinsecamente perversos" da fé cristã - embora tenham existido sempre, no seio do catolicismo (e das Igrejas protestantes), indivíduos, grupos e correntes atraídos pelas doutrinas revolucionárias modernas.

O que transforma estas analogias puramente virtuais em relação dinâmica de afinidade eletiva é uma conjuntura histórica determinada, uma constelação peculiar de eventos que se dá a partir do final dos anos 50. Por um lado trata-se de uma conjuntura mundial: a crise e renovação teológica do catolicismo europeu no pós-guerra, a eleição de João XXIII em 1958 e sua convocação de um novo Concílio, visando o aggiornamento da doutrina e das práticas da Igreja. Paralelamente, se desenvolve uma crise do marxismo (burocraticamente) institucional, com o XXº Congresso do PCUS e a denúncia do stalinismo. Estes eventos vão criar condições favoráveis para um relacionamento mais aberto entre cristianismo e marxismo, mas suas conseqüências na Europa não irão (com algumas exceções, sobretudo na França) mais além de um'"diálogo" entre dois blocos política e culturalmente opostos.

É na América Latina que se produzirão circunstâncias permitindo um processo muito mais radical de convergência. conjuntura latino-americana que tem seu ponto de partida neste momento histórico se caracteriza por dois aspectos fundamentais: a) um desenvolvimento acelerado do capitalismo, uma urbanização intensa e uma industrialização rápida (sob a égide do capital norte-americano), que aprofundam as contradições sociais, tanto na cidade como no campo; b) a revolução cubana (1959-60), primeira vitória popular contra o imperalismo na América Latina e primeira revolução socialista no continente -dirigida por forças marxistas de um novo tipo, independentes do comunismo tradicional (de inspiração stalinista). A combinação destes dois processos -um estrutural, econômico-social, e o outro, político e ideológico - terá por resultado o início de uma nova etapa na história da América Latina, uma etapa de lutas sociais, movimentos populares, e insurreições, que conhece um novo salto qualitativo com a revolução sandinista e que continua até hoje. Uma etapa que se caracteriza também por uma maior influência e uma renovação do pensamento marxista latinoamericano — em particular (mas não exclusivamente) nos meios universitários. É nesta conjuntura que vai se desenvolver, na América Latina, uma relação de afinidade eletiva, em certos setores da Igreja e de sua base social, entre cristianismo e marxismo. Uma relação que, partindo das analogias existentes, vai conduzir a uma aproximação, convergência, articulação entre estas duas culturas tradicionalmente opostas - chegando em alguns casos até a fusão, com a formação de uma corrente marxista cristã. Aliás, o conceito de afinidade eletiva (Wahlverwandtschaft) - que em Max Weber apenas descreve a relação de mútua seleção e reforço recíproco entre fenômenos sócio-culturais distintos - tem sua origem numa doutrina alquimista, que buscava explicar a fusão de corpos pela afinidade entre elementos de sua composição química...

No curso dos últimos trinta anos se desenvolveram inúmeras manifestações deste processo de convergência por afinidade eletiva. Em ordem cronológica, se destacam três momentos de importância histórica decisiva: a esquerda cristã brasileira do começo dos anos 60, a teologia da libertação e a revolução sandinista. Obviamente, existem outros modelos e formas significativos, que não podemos examinar nos quadros deste artigo. Por exemplo: o camilismo ( a partir do exemplo de Camilo Torres), a corrente "Cristãos pelo Socialismo", as diversas sensibilidades cristãs do PT brasileiro etc.

esquerda cristã brasileira, tal como aparece nos anos 60 na JUC, na JEC e na AP é a primeira forma que toma, na América Latina, a articulação entre fé cristã e política marxista -não como fenômeno individual, excepcional, mas como corrente com uma base social ampla (no meio universitário e mesmo em setores do clero regular). É interessante observar que este processo não é o resultado nem do Concílio Vaticano II, nem das comunidades de base, nem da teologia da libertação e tampouco do golpe militar de 1964: ele é bem anterior a todos estes eventos que usualmente são considerados como causas da evolução da Igreja no Brasil e na América Latina (e que sem dúvida jogarão um papel importante numa etapa posterior).

O fato de a juventude estudantil cristã ser o primeiro setor dentro da Igreja a conhecer a "tentação marxista" não é de surpreender, posto que este era o meio social em que maior influência tinham as idéias de Marx e de seus discípulos; processos similares terão lugar mais tarde no Chile e em outros países. A história da JUC é bastante conhecida, graças aos notáveis trabalhos de Luís Alberto Gomez de Souza, Oscar Beozzo, Emmanuel de Kadt e Thomas Bruneau; o que nos interessa no quadro desta análise é apenas situar seu lugar no processo histórico de transformação da cultura católica na América Latina. Dois aspectos merecem ser ressaltados neste contexto:

-a JUC dos anos 1960-62 representou a primeira tentativa, em todo o continente, de desenvolver um pensamento cristão utilizando elementos do marxismo. Trata-se, portanto, de um movimento pioneiro, com surpreendente criatividade intelectual e política, que, apesar de seu fracasso imediato, lançou sementes que iriam germinar mais tarde - no Brasil e no conjunto da América Latina. Com razão Pablo Richard se refere ao Congresso dos 10 anos da JUC (1960) como "o início de uma nova etapa na história do cristianismo brasileiro e latinoamericano"3. Cabe acrescentar que se tratava não só de um novo discurso, mas também de uma nova prática, no seio do movimento estudantil, no campo da educação popular (MEB) e mais tarde no terreno da ação política (AP). Por outro lado, é certo que a doutrina da JUC não tinha caráter teológico, mas representava uma elaboração de leigos sobre a realidade histórica do país. Não era um discurso sobre temas religiosos (cristologia, exegese bíblica, eclesiologia) mas sim uma análise -de inspiração religiosa (católica) - dos problemas econômicos, sociais e políticos do Brasil.

-Nesta primeira etapa (1960-62) os elementos marxistas integrados no discurso jucista são poucos, mas significativos: alguns conceitos - como alienação, condição proletária, um esboço de análise da exploração - ao se definir a classe operária como "o grupo dos que são obrigados a vender seu trabalho no mercado, em troca do salário não correpondente ao valor de sua cooperação no processo produtivo, e que não participam da gestão desse mesmo processo produtivo"; e uma opção geral anti-capitalist.a, pelo socialismo - nas palavras de Herbert de Souza: "somos contemporâneos do fim do capitalismo e do início da construção socialista mundial". Os ideólogos jucistas não se reclamam de Marx, embora rejeitem o tabu anti-marxista: segundo Herbert de Souza, "não temos Marx como mestre, pois já tínhamos um outro, antes. Mas sabemos ler também Marx". As principais referências dos documentos são estritamente católicas: Santo tomas, Leão XIII, Pio XII, João XXIII, etc4. Cabe acrescentar que a JUC não adere a nenhum modelo existente de marxismo no Brasil -como o PCB, ou alguma de suas dissidências - mas trata de fazer sua própria leitura do pensamento de Marx e da realidade brasileira (chegando a conclusões bem mais radicais que o PCB, alinhado com o populismo governamental).

Por que o Brasil foi o primeiro país em que esta dinâmica de afinidade eletiva entre cristianismo e marxismo pôde se desenvolver - conseguindo, no curso dos últimos 30 anos, maior impacto do que em qualquer outra Igreja da América Latina? Obviamente vários fatores históricos e estruturais entram aqui em jogo, mas um é particularmente relevante em relação ao processo de radicalização da JUC: a tradicional influência da Igreja e da cultura católica francesas sobre o Brasil - contrariamente ao resto do continente, onde predominaram os modelos ibéricos e italianos de cristandade. Ora, a teologia francesa do pós-guerra (Congar, Duquoc, Chenu, Calvez, de Lubac) representava a ponta avançada da renovação do catolicismo, levantando os temas que seriam depois consagrados pelo Concílio Vaticano II. Além disso, a cultura católica francesa é a unica que conheceu, durante todo o século XX, uma sucessão ininterrupta de figuras e correntes socialistas: de Charles Peguy ao grupo "Esprit", dos cristãos revolucionários da Frente Popular (1936-38) ao grupo "Témoignage Chretien" da Resistência (1940-45), e dos padres operários da Missão de França à corrente socialista do sindicato cristão CFFC (hegemônica no começo dos anos 60).

Além desta influência difusa - e do papel de missionários franceses presentes nesta época no Brasil (Jean Cardonnel e vários outros) - duas figuras do catolicismo francês progressista vão ter um impacto direto sobre a JUC dos anos 60: o padre Lebret e sobretudo Emmanuel Mounier. Embora hostil ao marxismo, Lebret não hesitava em utilizar categorias da economia marxista em seus estudos; ademais, ele reconhecia no socialismo "uma reação pró-humana contra o capitalismo enquanto sistema inumano"5. Mounier - segundo o padre Lima Vaz, "o mestre mais seguido pela juventude católica brasileira" dos anos 60 - é mais radical: rejeitando categoricamente o sistema capitalista, ele considera que os cristãos podem aprender enormemente com o marxismo. Definindo sua própria filosofia social, ele escreve em 1947: "O personalismo considera que as estruturas do capitalismo são um obstáculo que se levanta no caminho da libertação do homem e que elas devem ser destruídas em proveito de uma organização socialista da produção e do consumo" 6 . Nos documentos da JUC - como as diretrizes para um ideal histórico de 1960 - não só Mounier é citado com freqüência, mas se percebe a presença constante dos temas de sua obra: crítica do anonimato e impersonalidade capitalistas, da tirania do dinheiro etc. Não há dúvida que, para toda uma geração de católicos brasileiros, Emmanuel Mounier foi a ponte entre o anticapitalismo cristão e o anticapitalismo marxista. Num contexto explosivo como o era a sociedade brasileira neste período de crise do modelo populista (1960-64), Mounier e Lebret são re-interpretados e superados num processo de radicalização social e política crescente.

teologia da libertação não é a origem do cristianismo radical, mas sim, como insistem os próprios teólogos, o produto, o resultado de toda uma prática, de uma experiência anterior - a começar pela JUC brasileira de 1960-62. Segundo Clodovis Boff, "antes de a Teologia da Libertação (TdL) ter despontado, no final dos anos 60, já havia na Igreja da América Latina toda uma praxis libertadora. Antes do teólogo da libertação tivemos o bispo profético, o leigo comprometido e comunidades libertadoras. Isso já é principalmente nos inícios dos anos 60. A teologia, portanto, veio num segundo momento, E veio como expressão desta prática libertadora da Igreja. Isto significa que a TdL é a teologia de uma Igreja de libertação, de uma Igreja que opta preferencial e solidáriamente pelos pobres.7" Efetivamente, no curso dos anos 60 se desenvolveu em toda a América Latina (como resultado da conjuntura mundial e continental acima referida) uma corrente cristã solidária dos pobres, com uma prática conscientizadora e emancipadora, que participa em movimentos de cultura popular, de alfabetização, de organização de bairro, de sindicalização rural, e mesmo, em alguns países, em movimentos políticos de inspiração marxista. A idéia fundamental, que começa a germinar no bojo desta praxis, fruto da experiência junto aos pobres, aos camponeses sem terra, aos favelados, aos trabalhadores, às mulheres, aos negros e índios, é a de que só uma mudança radical das estruturas sociais - protagonizada pelos próprios pobres - pode acabar com a pobreza.

A teologia da libertação - isto é, o conjunto de escritos publicados, a partir de 1971, por figuras como Gustavo Gutierrez, Hugo Assmann, Pablo Richard, Leonardo e Clodovis Boff, Enrique Dussel, Frei Betto e vários outros - recolhe esta intuição e a coloca no centro de sua reinterpretação do Evangelho, de sua nova hermenêutica do Antigo-Testamento e da mensagem de Cristo, de sua reformulação do magistério da Igreja. Uma reformulação na qual entram aspectos essenciais do marxismo, integrados de forma muito mais orgânica e coerente no discurso religioso - em comparação com os documentos da esquerda cristã dos anos 60. O marxismo apareceu aos olhos dos teólogos da libertação como a única teoria capaz de oferecer ao mesmo tempo uma análise precisa e sistemática das causas da pobreza, e uma proposição precisa e radical do método para sua abolição. A velha tradição anticapitalista da Igreja entra assim em relação de afinidade eletiva com a análise marxista da exploração capitalista e com a crítica dos marxistas latino-americanos (teoria da dependência) ao capitalismo dependente como fundamento estrutural do subdesenvolvimento, da miséria e do autoritarismo militar.

solidariedade com o pobre é o ponto de partida deste processo de elaboração teológica. A grande diferença, a novidade decisiva, o salto qualitativo em relação à concepção católica tradicional do pobre, é que este já não é considerado corno vítima passiva, objeto de caridade e assistência, mas sim como sujeito de sua própria libertação. Graças a esta ruptura - fruto da experiência prática dos cristãos comprometidos no curso dos anos 60 e 70 - a problemática da teologia da libertação vai convergir com o princípio político fundamental do marxismo: a emancipação dos trabalhadores será a obra dos próprios trabalhadores.

A opção prioritária pelos pobres, aprovada pela Conferência dos Bispos Latino-Américanos de Puebla (1979) é, na realidade, uma fórmula de compromisso, interpretada num sentido tradicional (assistencialista) pelas correntes mais moderadas ou conservadoras da Igreja, e num sentido radical pelos téologos da libertação e as correntes mais avançadas do clero: como um engajamento na organização e na luta dos pobres por sua própria libertação. A luta de classes - não só como método de análise da realidade mas também como guia para a ação - se torna assim um elemento central (implícito ou explícito) na nova teologia. Como escreveu Gustavo Gutierrez: "negar o fato da luta de classes é, na realidade, tomar partido em favor dos setores dominantes. A neutralidade neste assunto é impossível"8.

Certos teólogos da libertação apresentam sua relação com o marxismo em termos utilitários: trata-se de um instrumento científico, uma ferramenta analítica. Este tipo de abordagem freqüentemente distingue no marxismo uma filosofia (ou ideologia) que é rejeitada enquanto incompatível com a fé cristã, e uma ciência social que pode e deve ser utilizada como mediação sócio-analítica. Trata-se de uma distinção que corresponde a duas motivações diversas mas convergentes: a) a influência do pensamento de Althusser, com sua teoria do "corte epistemológico" entre ciência e ideologia, e sua insistência em fazer de Marx "um homem de ciência como os outros" (Lavoisier, Galileu, etc); b) face à pressão antimarxista de Roma e dos bispos conservadores, a relação meramente instrumental com a ciência social marxista (sem a "ideologia") aparece como uma posição mais facilmente defensável.

Sem subestimar a importância da ciência social marxista, é difícil deixar de perceber que a relação entre cristianismo e marxismo na teologia da libertação é mais ampla e profunda do que o empréstimo heurístico de alguns conceitos analíticos. Enquanto processo de convergência por afinidade eletiva, esta relação se refere também a certos valores (comunitários), a certas opções ético-políticas (a solidariedade com os pobres), a utopias do futuro (uma sociedade sem exploração nem opressão). E na medida em que a teologia da libertação é a expressão de uma praxis social, de um movimento social, de uma experiência ativa na base da sociedade, seu encontro com o marxismo se dá também - e sobretudo - no terreno do compromisso prático com as lutas populares de libertação. Porque o marxismo não é apenas um método de interpretação, mas também, e acima de tudo (como insistia Marx na XI Tese sobre Feuerbach) um método de transformação da realidade. Ignacio Ellacuria observa com razão que a contribuição do marxismo à teologia da libertação é ao mesmo tempo ética, epistemológica (isto é, científica) e filosófica - ao que se deve entretanto acrescentar: social e política.

Isto não quer dizer que a teologia da libertação integra em sua visão de mundo o conjunto do pensamento marxista: obviamente ela rejeita aqueles aspectos que lhe parecem incompatíveis com a religião cristã - o ateísmo, o materialismo cosmológico, a crítica da alienação religiosa etc. Seu procedimento consiste na incorporação seletiva daqueles aspectos da teoria marxista congruentes com seu combate pela renovação da teologia, com sua interpretação do Evangelho, do Antigo Testamento e do magistério da Igreja. Mas a recíproca também é verdadeira: esta reinterpretação se faz à luz da situação dos pobres na América Latina e da experiência de seu combate pela libertação social (analisados com a ajuda do marxismo). É nesta dialética complexa, nesta interação mútua que se desenvolve o processo alquímico de afinidade eletiva.

revolução sandinista é a primeira desde 1789 na qual os cristãos - leigos e clero - jogaram um papel determinante tanto na base como na direção do movimento. A primeira na qual os cristãos não foram "aliados" (táticos ou estratégicos), mas uma componente orgânica da vanguarda revolucionária, a Frente Sandinista de Libertação Nacional. E a primeira na qual o cristianismo foi um dos ingredientes essenciais - junto com o marxismo e com a tradição de Sandino - na formação da ideologia que inspirou o combate revolucionário.

No curso dos anos 70 um número crescente de jovens e de estudantes cristãos descobre o "marxismo sandinista"; vários movimentos são formados, com o apoio de padres e religiosos (como o franciscano Uriel Molina e o jesuíta Fernando Cardenal) - movimento universitário cristão, movimento revolucionário cristão - cujos membros vão em sua grande maioria aderir ao FSLN. A primeira célula cristã da Frente Sandinista é constituída com a participação de Luis Carrion, Joaquín Cuadra, Alvaro Baltodano e Roberto Gutierrez, que se tornarão logo importantes dirigentes da organização. Enquanto isto o padre Ernesto Cardenal, fundador da comunidade de Solentiname, não hesita, desde 1973, em proclamar-se "um marxista que acredita em Deus e na vida depois da morte". Poeta e místico, Cardenal insiste que "não foi a leitura de Marx que me levou ao marxismo, mas sim a leitura do Evangelho". Num movimento de síntese espiritual mais intuitivo do que teológico, ele não hesita em afirmar que "o comunismo segundo Marx, a sociedade na qual não haverá egoísmo nem injustiça de nenhuma espécie, é o mesmo que nós cristãos entendemos por reino de Deus sobre a terra"9. Em 1977 o padre Gaspar Garcia Laviana (de origem espanhola) adere a uma frente guerrilheira do FSLN; justificando sua decisão, ele escreve em uma carta de 1978 (pouco antes de sua morte em combate): "Minha fé e o fato de que pertenço à Igreja Católica me obrigam a tomar uma parte ativa no processo revolucionário com o FSLN, porque a libertação de um povo oprimido é parte integrante da redenção total de Cristo. Minha contribuição ativa neste processo é um signo de solidariedade cristã com os oprimidos e com os que lutam por libertá-los"10.

Através destes vínculos, tanto na cidade (nas comunidades de base) como no campo (graças ao CEPA, Comitê Evangélico de Promoção Agrária), ao nível da ação prática e da reflexão espiritual, vai-se criando, no seio do movimento sandinista, uma forma de unidade orgânica inédita entre revolucionários cristãos e ateus. Quando se dá a insurreição final em 1978-79, as regiões onde a luta é mais intensa e bem organizada são em geral aquelas onde as CEBs, os delegados da palavra e os cristãos revolucionários haviam trabalhado nos anos precedentes: Monimbo, Masaya, Chinandega, Leon, Matagalpa, Esteli e os bairros pobres de Manágua.

Na Nicarágua teve lugar algo que não se tinha produzido em lugar nenhum anteriormente: os cristãos radicais (tanto leigos como clero) não só participaram ativamente na revolta contra Somoza, mas também assumiram responsabilidades centrais no novo governo revolucionário, sob a égide da FSLN. Constatando esta novidade, a Frente Sandinista observa em sua "Declaração sobre a religião" de 7 de outubro de 1980: "Os cristãos foram parte integrante de nossa história revolucionária em um grau sem precedente em qualquer movimento revolucionário da América Latina e talvez do mundo ... Nossa experiência mostrou que era possível ser ao mesmo tempo crente e revolucionário dedicado, e que não havia contradição entre os dois."

Esta participação cristã ativa - criticada com hostilidade crescente pela hierarquia oficial da Igreja nicaragüense (o Cardeal Obando e a maioria dos bispos) e pelo Vaticano, mas contando com a simpatia das ordens religiosas do país (em particular os jesuítas) - marcou o próprio sandinismo, enquanto ideologia original composta pela fusão do nacionalismo agrário radical de Sandino, do cristianismo revolucionário e da corrente güevarista do marxismo latino-americano. A terminologia, os símbolos, as imagens da cultura sandinista são freqüentemente de inspiração cristã: isto se percebe tanto na base do movimento como nos discursos de alguns dos principais dirigentes da FSLN como Luis Carrion e Tomas Borge. Comentando o fenômeno, o teólogo italiano Giulio Girardi observa em seu livro sobre a Nicarágua sandinista: "O sinal mais evidente desta influência está no fortíssimo impulso ético que permeia a revolução. Até o ponto em que muitos teóricos europeus da revolução, paladinos da "cientificidade" do discurso revolucionário, não duvidariam em qualificá-lo de "moralista" e "ideológico". Certamente, não há motivo para se atribuir aos cristãos a exclusividade das preocupações éticas: entretanto a insistência com que são invocadas, a linguagem em que vêm formuladas, a referência explícita a Cristo, ao Evangelho e à Bíblia, por parte de dirigentes publicamente leigos, nos autoriza a ver nesta sensibilidade também o reflexo da presença cristã"11.

A própria prática da Frente Sandinista foi também influenciada pelos ideais cristãos: por exemplo, no que concerne ao princípio proclamado por Tomas Borge: "Nossa vingança será o perdão". A revolução nicaraguense aboliu a pena de morte e se transformou no primeiro movimento revolucionário moderno desde 1789 que não conheceu a guilhotina ou as execuções depois do triunfo.

É evidente que esta convergência não se deu sem contradições, resistências e desconfianças - de ambos os lados. Segundo Giulio Girardi havia entre os quadros Sandinistas duas atitudes distintas:

- a velha concepção "ortodoxa" - inspirada pelos manuais de "marxismo-leninismo" soviéticos: os cristãos são aliados, mas pouco seguros devido à sua fé e aos vínculos com a Igreja. No melhor dos casos a convergência pode se realizar com eles ao nível da prática, mas nunca da teoria, posto que aí a contradição (entre "materialismo" e "idealismo") é total. Esta atitude se encontra freqüentemente entre os quadros médios de formação recente, sem experiência antes de 1979.

- a nova concepção, que se poderia chamar de "nicaragüense" - inspirada pela experiência concreta de luta comum: os cristãos revolucionários fazem parte da vanguarda. É necessário reformular (ou atualizar) a teoria marxista tradicional da religião e reconhecer a esta seu potencial revolucionário. A convergência com os cristãos revolucionários é ao mesmo tempo prática e teórica, no que concerne à questão da libertação dos oprimidos. Esta última será a atitude partilhada pela maioria dos dirigentes "históricos" da FSLN.12
Um exemplo característico desta postura original e inovadora dos Sandinistas é a análise do comandante Luis Carrion, ao descrever, numa entrevista em agosto de 1985, como se deu este processo de convergência e fusão orgânica no curso do processo revolucionário que levou ao triunfo de julho de 1979: "Não vejo nenhum obstáculo que possa impedir aos cristãos, sem renunciar à sua fé, de se apropriar de todos os instrumentos conceituais marxistas que são necessários para a compreensão científica dos processos sociais e para a orientação revolucionária de sua prática política. Em outros termos, um cristão pode ser ao mesmo tempo um cristão e um marxista perfeitamente conseqüente. (...) Neste sentido nossa experiência é rica de ensinamentos. Muitos cristãos militaram e militam na Frente Sandinista e alguns deles até são padres. E não me refiro unicamente aos militantes de base: alguns deles são membros da Assembléia sandinista e detêm altas responsabilidades políticas. (...) Penso que certas vanguardas marxistas tiveram a tendência a perceber os setores cristãos progressistas e revolucionários como uma força rival que ganha uma fração da clientela política destes partidos. Penso que isto é um erro. Ter evitado este erro foi um dos grandes sucessos da FSLN. Nós nos ligamos a estruturas de base da Igreja, não para ganhar as pessoas, mas para integrá-las na Frente Sandinista, como uma etapa de seu desenvolvimento político, mas sem que isto signifique uma oposição qualquer à sua participação nos organismos cristãos. Ao contrário, nós deixamos as pessoas nestas estruturas para que este compromisso superior se transforme em ação política neste meio. Sua integração na FSLN nunca lhes foi apresentada como um dilema entre sua fé cristã e seu militantismo na Frente. Se nós tivéssemos colocado o debate nestes termos, teríamos ficado reduzidos a um número ínfimo de militantes"13.
***
Se poderá discutir longamente entre nós (marxistas e ateus) sobre o enigma filosófico - ou o desafio teórico - que significa o cristianismo marxista do ponto de vista do materialismo histórico ou dialético. Se se define o marxismo antes de tudo como um materialismo (abstrato e metafísico), se trata sem dúvida de uma heresia inaceitável. Se, ao contrário, ele é concebido prioritariamente como uma filosofia da praxis (Gramsci), uma teoria da prática revolucionária de transformação do mundo, sua incorporação por afinidade eletiva no seio do cristianismo revolucionário é perfeitamente compreensível.
De qualquer forma, para o método marxista, o essencial é o que se passa na realidade. Ora, os cristãos marxistas - da Nicarágua, do Brasil e de vários outros países - existem: trata-se de um fato social e político inegável! Não somente eles existem mas trazem ao movimento revolucionário urna sensibilidade moral, uma experiência no trabalho popular de base e uma exigência utópica que não podem senão enriquecê-lo.




1 Cardinal Ratzinger, "Les conséquences fundamentales d'une option marxiste" (1984), Théologies de la liberation, Paris, Cerf, 1985, p.122-130.         [ Links ]Este texto é anterior à famosa "Instrução sobre alguns aspectos da 'Teologia da Libertação" da Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé, presidida pelo próprio Cardeal Ratzinger. 
2 Max Weber, Economie et Société, Paris, Plon, 1971, pp.591-92.         [ Links ]

3 Pablo Richard; Morte das cristandades e nascimento da Igreja, S.Paulo, Edições Paulinas, 1984, p.154.         [ Links ]

4 Regional Centro-Oeste da JUC, "Algumas diretrizes de um ideal histórico cristão para o povo brasileiro" (1960) e Herbert de Souza,         [ Links ] "Juventude cristã hoje" (1962),         [ Links ] publicados en anexo ao livro de Luiz Gonzaga de Souza Lima, Evolução política dos Católicos e da Igreja no Brasil. Hipóteses para urna Interpretação, Petrópolis, Vozes, 1979, pp.84-97, 108-117.         [ Links ]

5 L. J. Lebret, Pour une civilisation solidaire (1959), Paris, Economie et Humanisme, 1963, p.53.         [ Links ]
6 E. Mounier, "Qu'est-ce que le personnalisme?" (1947), Oeuvres, III, Paris, 1963, p.244.         [ Links ]
7 Leonardo e Clodovis Boff, Teologia da Libertação no debate atual, Petrópolis, Vozes, 1985, p.16.         [ Links ]
8 G. Gutierrez, Théologie de ta Libération - Perspectives, Bruxelles, Lumen Vitae, 1974, pp. 276-77         [ Links ]
9 Ernesto Cardenal, "Comunismo igual reino de dios en la tierra", Muro Latino, Medellin, 1973, p. 37-42.         [ Links ]
10 Comandante Padre Gaspar Garcia Laviana, Folletos Populares Gaspar Garcia Laviana, nº 8, Manágua s.d. p. 21.         [ Links ]
11 Giulio Girardi, Fé en la revolución, revolución en la cultura, Editorial Nueva Nicaragua, Managua, 1983, p. 63.         [ Links ]
12 Ibid., p. 69. 
13 Comandante Luis Carrion, "Les Chrétiens dans la révolution sandiniste", Inprecor, nº 246, Paris, 6.7.1987, p. 16.         [ Links ]
















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